De mais odiado a candidato a novo Leicester: o surpreendente RB Leipzig

comemoração RB Leipzig x Borussia Dortmund (Foto: REUTERS/Stefanie Loos )RB Leipzig venceu o poderoso Borussia Dortmund por 1 a 0 (Foto: REUTERS/Stefanie Loos )

Mais da metade do primeiro turno do Campeonato Alemão já se passou, e o Bayern de Munique vê um rival no seu calcanhar. Não são os tradicionais Borussia Dortmund e Mönchengladbach, Schalke ou Bayer Leverkusen. Motivado a muito energético e dinheiro de sobra, o RB Leipzig é a sensação do momento no país e surge como um candidato a quebrar os sites e casas de apostas tal qual o Leicester. O detalhe é que, diferentemente do carismático time de Claudio Ranieri, Vardy e Mahrez, os alemães não são muito bem quistos pelos torcedores locais, fruto do aporte financeiro da Red Bull, acionista majoritária do clube na prática – embora a Bundesliga proíba na teoria. 

Gostem ou não, o Leipzig parece ter fôlego para habitar a área nobre da tabela em seu primeiro ano na elite e dorme hoje na liderança do campeonato após vencer o Leverkusen, de virada por 3 a 2, nesta sexta-feira. No sábado, o Bayern ainda tem difícil compromisso em clássico com o Borussia Dortmund, no Westfalenstadion (Signal Iduna Park).

A história do clube começa em 2009, quando seus acionistas compraram os direitos do SSV Markranstädt. Batizado de RasenBallsport Leipzig (traduzido para “Esporte da Bola sobre o Gramado”, numa alusão às iniciais da empresa que o banca), largou na quinta divisão alemã e, muito em razão da força financeira que move as engrenagens do clube, teve uma ascensão sem precedentes. Sete anos depois estaria disputando a Bundesliga e, mais que isso, brigando pelo topo com o todo-poderoso Bayern até que se prove o contrário.   

O time mais odiado da Alemanha

A ascensão, é bem verdade, teve lá seu preço. Em um país de fanáticos por futebol, um time sem tradição alguma, financiado por uma empresa (austríaca, cabe destacar), não caiu muito bem no gosto do público. Rapidamente, o Leipzig passou a ser conhecido como o time mais odiado da Alemanha. Na partida contra o Dynamo Dresden, em agosto, pela Copa da Alemanha, a cabeça de um touro foi lançada no gramado por torcedores rivais. Um protesto mais gritante, entre outras manifestações do tipo, contra aquele que, dentre 36 times, foi considerado o mais impopular do país em pesquisa da Braunschweig Technical University.

Dynamo Dresden Cabeça de touro em jogo do RB Leipzig (Foto: Reprodução / Twitter)Cabeça de touro jogada pela torcida do Dynamo Dresden contra o RB Leipzig (Reprodução / Twitter)

– Dos jogos que eu fui fora de casa, só contra o Wolfsburg não teve protesto. Mas sempre foi coisa bem leve: grito na entrada do campo, painel da torcida, protesto rápido assim. Com exceção do jogo contra o Colônia, que eles sentaram no asfalto e não deixaram o ônibus chegar na rua. Houve ainda uma cabeça de touro atirada, mas eu ainda estava jogando na pré-Champions pelo Salzburg – disse o volante brasileiro Bernardo, que chegou ao Leipzig nesta temporada após defender a “filial” da Red Bull na Áustria, o Salzburg.

A revolta maior é por parte de torcedores de times tradicionais que não aceitam ver um rival bancado por uma empresa ganhar espaço. Além disso, legalmente, um clube não pode ter um dono na Alemanha – somente após 20 anos um acionista pode assumir majoritariamente o controle da equipe. 

Trata-se da regra do 50%+1, criada em 1998, em que os torcedores devem sempre ter a palavra final. Bayer Leverkusen (Bayer), Wolfsburg (Volkswagen), Hoffenheim (SAP) também são custeados por uma multinacional poderosa. No caso do Leipzig, porém, os votantes são praticamente todos funcionários da empresa, uma maneira de burlar a lei. Segundo a imprensa alemã, a Red Bull ainda dificulta a entrada de novos sócios para proteger o seu poder.

– Acho que essa fama é injusta. Na cabeça desses caras é diferente porque o time foi criado pela empresa. O Bayern e o Leverkusen são centenários, mas no fundo é a mesma coisa. É um pensamento hipócrita – afirmou Bernardo, que está fora da equipe nos últimos jogos em razão de uma lesão no joelho. 

A Alemanha Oriental na Bundesliga

Apesar de toda a rejeição, o time é bem-vindo em, ao menos, uma região da Alemanha. Afinal, é o primeiro clube a representar a antiga Alemanha Oriental na década na Bundesliga. Já a cidade, com tradição no futebol, não tinha um time na elite desde 1994, quando o VfB Leipzig caiu. 

E, por lá, os Touros são aceitos. Tanto é que 70% dos cidadãos de Leipzig que participaram de um levantamento feito pelo jornal Leipziger Volkszeitung apoiaram a criação de um novo clube na cidade, mesmo que bancado por uma empresa estrangeira. 

Uma pesquisa recente do diário “Bild” também mostrou que o time possui 15% dos torcedores da região de Turíngia e Saxônia, atrás somente de Bayern e Borussia Dortmund (os dois com 22%). A média de público é a nona maior da Bundesliga, de 41.191 torcedores por jogo – valor que supera qualquer clube brasileiro.

– A torcida abraçou o time completamente. Há 15 anos que um time da Alemanha Oriental não estava na Bundesliga. Era um lado que o futebol estava esquecido. Os times orientais caíram para as divisões de baixo com a reunificação. Não é só a cidade que torce para o nosso time, mas um lado inteiro da Alemanha – completou Bernardo.

Bernardo RB Leipzing (Foto: Reprodução / Instagram)Bernardo jogou em três “filiais” até chegar ao RB Leipzig (Foto: Reprodução / Instagram)

Um grande projeto

O Leipzig é parte de um grandioso projeto esportivo da Red Bull. Além das duas escuderias de Fórmula 1 (RBR e Toro Rosso) e de outros tantos atletas espalhados pelo mundo, a empresa possui outros três times de futebol, todos batizados com o nome da empresa: New York RB, RB Salzburg e RB Brasil – fora a versão de Gana, já extinta.   

O exemplo de maior sucesso é a versão austríaca. Comprado em 2005, o RB Salzburg virou a grande força em seu país e faturou seis dos oito últimos títulos nacionais, acabando com o duopólio de Rapid e Áustria Viena. Falta agora dar o salto a nível continental. A tão sonhada vaga na fase principal da Liga dos Campeões ainda não veio, e as campanhas na Liga Europa são apenas figurativas. O que não faz dele menos odiado que a versão de Leipzig.   

Kolbeinn Sigthorsson Ajax e Andre Ramalho do RB Salzburg  (Foto: Getty Images)Ex-time de Andre Ramalho, RB Salzburg brilha na Áustria, mas ainda está devendo na Europa (Foto: Getty Images)

– Na Áustria, talvez, posso dizer que é odiado. Lá, o RB é o maior time, não em tradição. Tem a visão de jogadores e torcedores. Há atletas que não defenderiam o time. Mas a maioria jogaria, os jogadores sabem da visibilidade que é. Na Alemanha, o Leipzig, assim como o Hoffenheim e o Wolfsburg, são clubes empresas. É um clube bastante odiado pelos torcedores, mas acho que varia de torcida para torcida. Tem aqueles que entendem e tudo bem. Mas tem outros de muita tradição que até tentam boicotar. Não são todos. Na segunda divisão, tinha até mais protesto que na primeira. Na primeira, o Leipzig tem dinheiro, mas não é só ele – disse o também brasileiro André Ramalho, que defendeu o Salzburg e hoje atua no Mainz, também da Bundesliga.

Tanto Ramalho quanto Bernardo são crias da versão brasileira da equipe, que disputa a elite do Paulista e jogou a Série D do Brasileiro no ano passado. Ambos seguiram para o Salzburg e tiveram ofertas do Leipzig em seguida. Apenas Bernardo seguiu para lá. Com a equipe à época na segunda divisão, Ramalho preferiu se mudar para o Bayer Leverkusen (com quem ainda tem contrato, apesar de estar emprestado ao Mainz). 

– Eles veem os jogadores que estão se destacando. No meu caso, o Carlos Andrade, que hoje é diretor de base do RB Brasil, conversou comigo e falou do interesse do Salzburg. Ele me chamou para fazer um teste na Áustria. Fui para o time B e depois subi para o principal. Aí apareceu o interesse do Leipzig, que ainda estava na segunda divisão e queria que eu fosse lá para tentar ajudar o time a subir. Não dá para dizer que o clube tem que vender (para outro clube na companhia), no final das contas é sempre opção do jogador. Agora, dificilmente alguém diz não dentro do clube – explicou André Ramalho, com passagem ainda pela base de Palmeiras e São Paulo.

Ainda assim, apesar de vinculados à mesma empresa e das transferências “caseiras”, os clubes mantêm alguma independência e quem dá a palavra final é o jogador.

– Os clubes têm uma hierarquia. O RB Leipzig no topo, o RB Salzburg em seguida e o RB Brasil abaixo. O de Nova York não coopera tanto assim com os outros times, por ser de uma liga como a MLS. Os demais fazem negócios entre eles. Se fizesse uma hierarquia, colocaria dessa maneira. Mesmo com essa cooperação, os times são independentes, e os jogadores têm opções de escolher quais times jogar – disse Bernardo.

O homem por trás do sucesso

Para se ter ideia do poderio financeiro do novato da Bundesliga, o RB Leipzig foi o quarto clube que mais investiu em reforços nesta temporada na Alemanha: € 50 milhões (R$ 181,5 milhões) – Borussia Dortmund, Bayern de Munique e Wolfsburg foram os únicos a gastarem mais. Mas o segredo da campanha surpreendente não é apenas o dinheiro em caixa. A estrutura é invejável, e a base já revelou promessas para Bayern e seleção alemã, como o volante Joshua Kimmich.

Ralf Rangnick sente dor na coxa ao correr de Davie Selke na comemoração do acesso do Leipzig à Bundesliga (Foto: AP Photo/Jens Meyer)Ralf Rangnick é um dos grandes responsáveis pelo sucesso da equipe alemã (Foto: AP Photo/Jens Meyer)

Só que, na Alemanha, o sucesso é atribuído principalmente ao diretor esportivo da equipe, Ralf Rangnick. Como treinador, ele foi responsável por outra ascensão meteórica na década passada, a do Hoffenheim (que hoje é o terceiro colocado da Bundesliga). Depois, já fora da comissão técnica, participou do projeto vitorioso do Salzburg entre 2012 e 2015 até assumir oficialmente o Leipzig. Sempre com o perfil de não contratar jogadores renomados, mas trazer jovens com potencial.

– O Ralf tem essa filosofia que ele aplicou no Salzburg e agora no Leipzig. É uma filosofia em que os 11 têm que jogar, correm muito. Tem que fazer pressão na bola e não pode deixar o adversário pensar muito. Se possível, manter a bola o mais longe do nosso gol, tentar fazer a pressão desde a zaga. Obviamente, consiste em ter uma boa segurança lá atrás. No momento em que se ganha a bola tem que fazer a transição ofensiva, bem no momento em que o adversário está desorganizado. É basicamente isso: fazer uma transição muito rápida, tanto na defesa quanto no ataque – disse André Ramalho, que trabalhou com Ralf na Áustria.

Na equipe atual, aparecem entre os destaques o volante Naby Keita (21 anos), de Guiné, o meia sueco Emil Forsberg (25), o atacante alemão Timo Werner (20) e o ponta austríaco Marcel Sabitzer (22). Juntos, eles somam 15 dos 20 gols marcados pelo Leipzig até aqui. O time é o que mais balançou as redes em contra-ataques (quatro, junto com o Bayern), o segundo a conceder menos finalizações ao adversário (8,4 por jogo) e tem apenas a nona maior média de posse de bola (49%) – números e características que lembram a campanha do Leicester na última Premier League. Sonhar está permitido.

Apenas um adendo, a diferença do Leipzig para o Bayer Leverkusen e Wolfsburg, equipes estas também vinculadas a grandes empresas, é que as duas equipes foram formadas por operários da farmacêutica e da fábrica de automóveis. Diferentemente da equipe do Leipzig que foi adquirida pela Red Bull.

Fonte:       http://globoesporte.globo.com/

São Paulo – Brasil – 23:42

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Josy Galvão

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